Fotos de família de Porto de Galinhas são achadas em rodoviária de Porto Alegre após enchente e devolvidas dois meses depois


Álbum estava em parada de ônibus ao lado de estação da capital gaúcha, que ficou inundada durante cheia. Registros foram recuperados por jornalista e devolvidos em junho. Álbum achado nas enchentes do Rio Grande do Sul tem fotos de família que mora em Porto de Galinhas, no Litoral Sul de Pernambuco
Acervo pessoal
Um álbum com fotografias de uma família que vive no Litoral Sul de Pernambuco foi encontrado no banco de uma parada de ônibus ao lado da rodoviária de Porto Alegre, que ficou inundada durante as enchentes no Rio Grande do Sul entre abril e maio deste ano.
Os registros fotográficos foram devolvidos no fim do mês passado à psicóloga paulista Maysa Mimtz na praia de Porto de Galinhas, em Ipojuca, no Grande Recife, onde mora há dez anos e é dona de uma pousada.
“Uma pessoa achou o álbum e deixou encostado no banco. (…) Estava ali quietinho, esperando uma alma boa achar”, disse Maysa.
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A história foi publicada pelo jornal Zero Hora. Ao g1, a psicóloga contou que o álbum estava guardado numa mochila que ela esqueceu no assento de um ônibus durante uma viagem a Balneário Camboriú (SC), onde vivem os familiares do marido dela, Dennys.
Para a empreitada da viagem de mais de 3,2 mil quilômetros entre Pernambuco e Santa Catarina, o casal estava na companhia dos filhos, Raul e Mel, que têm, respectivamente, 6 e 8 anos.
A jornada começou na primeira semana de abril. Primeiro, o grupo foi de carro para São Paulo. Após visitar alguns parentes na capital paulista, a família decidiu fazer o resto do percurso de ônibus, numa rota que passava pelo litoral catarinense e tinha como destino final a capital gaúcha.
Só depois de desembarcar em Balneário Camboriú foi que Maysa percebeu que tinha deixado sua mochila no ônibus. Nela, estavam alguns objetos de valor sentimental que a filha pretendia levar para a avó paterna; entre eles, o álbum de fotos da família e um livro que a menina tinha escrito.
Maysa disse que não lembra exatamente o dia em que chegou a Balneário Camboriú, mas acredita que passou pela cidade perto do dia 15 de abril, mais de duas semanas antes do temporal que devastou Porto Alegre depois de atingir várias cidades gaúchas.
“Entrei em contato com a empresa de ônibus, mas, infelizmente, não acharam. E [a mochila] era uma responsabilidade minha. Então, tudo bem, dei por fim, queria nem lembrar porque eram coisas pessoais”, disse a psicóloga.
O que ela não imaginava era que o álbum seria achado mais de um mês depois, no dia 26 de maio, pelo jornalista Leandro Staudt. Naquele momento, a água do Rio Guaíba, que inundou diversos bairros de Porto Alegre, ainda estava baixando. A bolsa com os demais objetos nunca foi encontrada.
Rodoviária de Porto Alegre ficou debaixo d’água durante cheia do Guaíba
Reprodução/RBS TV
Um álbum de fotos nas ruas alagadas
Leandro Staudt contou ao g1 que era domingo de manhã quando achou o álbum de fotografias sobre o banco da parada de ônibus, do lado de fora do terminal rodoviário, no Centro Histórico de Porto Alegre.
Como costumava fazer nos dias de folga, o jornalista estava andando de bicicleta pelas ruas alagadas para observar os impactos da cheia nas construções da cidade. Naquele local, segundo o repórter, o acúmulo de água chegou a 1,60 metro de altura.
“Fiz medições para ver as marcas da enchente e guardar de memória o nível em que ficou a água. Naquele domingo, consegui chegar ao lado da rodoviária. Estava ali, fazendo fotos e vídeos, sozinho, o trânsito estava fechado. E daí vi que alguém que tinha passado antes deixou esse álbum na parada de ônibus”, contou Leandro ao g1.
O álbum estava encharcado e a água danificou parte das imagens impressas. O jornalista recolheu o caderno e o levou para casa, onde limpou as fotos e as deixou penduradas no varal por dois dias até secarem. Ele conseguiu recuperar 24 imagens. Outras, que tinham sido coladas pela lama, tiveram que ser descartadas.
“Abri o álbum, tive que estragar ele, rasguei saquinho por saquinho, cortei e tirei as fotos. Lavei e pendurei para ver se ia ter salvação. Daí, 24 foram salvas. Imaginei que fosse um álbum um pouco mais antigo, que as crianças que apareciam ali já fossem adolescentes, porque a enchente deu um ar um pouco mais envelhecido para as imagens”, recordou.
Ao recuperar as fotos, Leandro fez uma postagem nas redes sociais para tentar achar as pessoas daquela história, daquela vida. Após um dia de mobilização na internet, recebeu mensagens de dois seguidores, que moram no litoral do Rio Grande do Sul, e disseram que conheciam a família.
“Eles disseram: ‘A gente conhece a família’. Deram os contatos e falaram por cima: ‘Eles não são daqui; são de Pernambuco. E não vieram a Porto Alegre’. Achei mais estranha ainda a história e, como tinha o contato ali, liguei para Maysa e ela me contou tudo. (…) Imagino que alguém tenha ficado com a mochila e jogado fora o que tinha dentro em algum canto no entorno da rodoviária. E a enchente jogou esse álbum bem na rua, de frente para a estação”, comentou Leandro.
O caderno e as recordações fizeram outra grande viagem. Dessa vez, para reencontrar a família em Pernambuco. O álbum foi entregue em Porto de Galinhas, em 27 de junho, 31 dias depois de ser recolhido pelo jornalista, por uma amiga e colega de trabalho de Leandro, que viajou ao estado e curtia as férias na praia do Litoral Sul pernambucano.
“Depois até surgiu o relato de uma seguidora falando que o pai contou a história de um álbum que ele deixou e ficou bastante abalado quando viu as fotos. Depois que vi essa publicação, juntei os pontos e acredito que seja o mesmo [álbum]. Não fui atrás, mas teria sido alguém que passou antes de mim, viu esse álbum no chão já seco e colocou ali imaginando que alguém poderia levar”, explicou Leandro Staudt.
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Novo caderno de memórias
Além de recuperar as imagens, o jornalista reuniu as fotos num novo caderno e, na capa, pôs uma etiqueta na qual digitou: “Fotos de uma família feliz encontradas na enchente de 2024 em Porto Alegre”.
Junto do novo álbum, Leandro enviou uma carta escrita à mão para Maysa, Denys, Mel e Raul (veja foto ao fim desta reportagem):
“Espero que estejam bem. Por meio da minha amiga, Rosane de Oliveira, envio as fotos recuperadas em maio de 2024 na maior enchente da história de Porto Alegre. As imagens carregam as marcas da água, mas mantêm a alegria de vocês. Sejam felizes, e espero visitar vocês um dia em Porto de Galinhas”, escreveu o jornalista.
Maysa disse que ficou muito contente ao ver de novo as fotos que tinha perdido.
“Ficaram boas, ficaram só com uma marca em volta. Nas fotos em si, dentro, está toda a família aparecendo. Só ficou uma marca diferente. (…) Um álbum é para mostrar, conversar, contar histórias, dar muitas risadas. A felicidade que é quando mostramos um álbum de fotos para alguém”, descreveu Maysa.
Assim, com as marcas deixadas pelo Rio Guaíba, a história do álbum hoje guardado em Pernambuco não só se tornou uma recordação da maior enchente do Rio Grande do Sul como trouxe uma mensagem de esperança e solidariedade.
“Era algo pequeno, mas que, dentro do contexto, me dava um ar de esperança de poder ajudar alguma família a preservar alguma coisa da sua memória. E, ao mesmo tempo, gerou uma rede de solidariedade, [com] as pessoas compartilhando, tentando encontrar a família”, comentou Leandro Staudt.
Carta enviada pelo jornalista Leandro Staudt à família do álbum que ele encontrou após enchente em Porto Alegre
Acervo pessoal
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