MP investiga vereador de Rio Branco suspeito de intolerância religiosa e racismo


MP-AC pediu que a Polícia Civil também investigue os crimes supostamente praticados pelo vereador N. Lima (PP) durante discurso na Câmara de Vereadores de Rio Branco no último dia 10. Vereador nega que tenha ofendido as religiões de matrizes africanas e se defende. Vereador N. Lima é alvo de investigações do MP-AC
Arquivo/Câmara
O Ministério Público do Acre (MP-AC) instaurou uma notícia de fato para apurar os crimes de intolerância religiosa e racismo supostamente praticados pelo vereador Manoel José Nogueira Lima, mais conhecido como capitão N. Lima (PP), durante discurso na Câmara de Vereadores de Rio Branco.
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Além da apuração interna, o MP-AC requisitou que a Polícia Civil também investigue os crimes. Em 2020, o vereador já foi alvo de polêmica ao ler uma fake news durante sessão on-line da Câmara de Vereadores de Rio Branco
No último dia 10, durante sessão presencial no plenário, o vereador usou a plenária para defender o Projeto de Lei Bíblia nas Escolas, do pastor Arnaldo Barros, que prevê a disponibilização do livro religioso nas instituições de ensino do município. O projeto tramita pela Casa.
Durante o discurso, o parlamentar destaca que critica pessoas de direita que praticam o cristianismo, mas defendem movimentos que, segundo ele, descredenciam o cristianismo.
“A maioria, vejo hoje, as igrejas, sem exceção, a não ser as que seguem o satanás. Elas seguem mesmo, defendem com maior loucura do mundo. Vão lá, fazem macumba e o diabo a quatro e prejudicam a sociedade” disse.
As declarações causaram revolta e resultaram em uma nota de repúdio do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Rio Branco (Compir) assinada por 14 entidades.
A nota ressalta que as falas preconceituosas e carregadas de racismo religioso do vereador significam um ‘conjunto de práticas violentas que expressam a discriminação e o ódio pelas religiões de matriz africana e seus adeptos, assim como pelos territórios sagrados, tradições e culturas afro-brasileiras’. Confira o comunicado na íntegra abaixo.
“Nesse sentido, esperamos que haja retratação pública dos envolvidos no caso, e em não havendo a retratação, que o caso seja avaliado pela Comissão de Ética da Câmara Municipal de Rio Branco/Acre, bem como sejam tomadas as devidas providências para evitar que a Casa do Povo seja palco de atos racistas e intolerantes”, diz parte do comunicado.
Nesta terça-feira (16), o vereador se posicionou sobre as acusações de intolerância religiosa e racismo e afirmou que a expressão dita durante a sessão na Câmara não foi dirigida as religiões de matriz africanas.
Ele alegou ainda que respeita o estado laico, a constituição federal e as várias culturas. “Foi uma expressão sobre as religiões ou seitas que praticam cerimônias satânicas invocando o satanás, que praticam sacrifício com ser humano, que não tem nada a ver com as religiões de matrizes africanas. Sou um colaborador dessas entidades, já fui atendido por elas em consultas espirituais”, argumentou durante parte do discurso.
Nota na íntegra do Compir:
O Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Rio Branco/AC – COMPIR, vem à público repudiar toda e qualquer fala com suposta conduta intolerante e racista religiosa proferida durante a sessão ordinária, ocorrida no dia 10 de julho de 2024, na Câmara Municipal de Rio Branco.
Na intenção de defender o projeto de lei “Bíblia Nas Escolas” a tribuna foi utilizada para proferir a seguinte afirmação: “A maioria que eu vejo hoje, igrejas, todas, sem exceção, a não ser as igrejas que seguem o satanás. Elas seguem mesmo ele. Elas defendem com maior loucura do mundo. Vão lá fazem macumba e o diabo a quatro”, assim afirmou o vereador N. Lima.
Em breve pesquisa no Google, é possível identificar que o termo “macumba” significa: 1- em termos de religião, uma designação genérica dos cultos afro-brasileiros originários do nagô e que receberam influências de outras religiões africanas, e também ameríndias, católicas, espíritas e ocultistas; 2- em termos de música, um antigo instrumento de percussão de origem africana, que era outrora usado em terreiros de cultos afro-brasileiros.
Essa terminologia, muito utilizada na tentativa de demonizar essas religiões, faz-se ofensiva pois, externaliza uma profunda intolerância à religião do outro, que faz uso do direito garantido pela Constituição Federal de 1988, que diz: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. (Artigo 5º, inciso VI).
Ressaltamos que a liberdade de crença e culto é um direito fundamental, protegido pelos artigos 18 e 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e pelos artigos 14 e 17 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, dos quais o Brasil é signatário. Faz-se importante ainda dizer que, o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) tem, em seu capítulo III, quatro artigos que tratam do direito à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício dos cultos religiosos.
Dentre eles podemos citar o artigo 26 que determina que “o poder público adotará as medidas necessárias para o combate à intolerância com as religiões de matrizes africanas e à discriminação de seus seguidores”.
Assim sendo, as falas preconceituosas, carregadas de racismo religioso, que em breve descrição significa: um conjunto de práticas violentas que expressam a discriminação e o ódio pelas religiões de matriz africana e seus adeptos, assim como pelos territórios sagrados, tradições e culturas afro-brasileiras. Longe de ser aporte para a defesa de propostas que em tese deveriam colaborar para combater o racismo, o preconceito e a discriminação em suas diversas faces, é utilizada para ofender, fortalecer a ira e incentivar perseguições. Nesse sentido, esperamos que haja retratação pública dos envolvidos no caso, e em não havendo a retratação, que o caso seja avaliado pela Comissão de Ética da Câmara Municipal de Rio Branco/Acre, bem como sejam tomadas as devidas providências para evitar que a Casa do Povo seja palco de atos racistas e intolerantes.
Confira a nota na íntegra
Sobre minha fala ao defender o projeto “ Bíblia na Escola”
Em primeiro lugar, sou um cidadão público com direitos iguais a todos os cidadãos brasileiros, de acordo com a nossa Constituição Federal (liberdade de expressão na tribuna do parlamento). Meu posicionamento está assegurado na carta magna do país.
Esclareço que o projeto foi apenas apresentado e quando chegar nas comissões será discutido amplamente com a sociedade e todos os órgãos e entidades envolvidas no assunto; (o direito de vocês de ser contra o projeto também está respaldado Constituição Federal).
Na minha fala por ocasião da discussão apresentada pelo excelentíssimo vereador Arnaldo Barros, com relação a “macumba do satanás” foi uma expressão sobre as religiões ou seitas que praticam cerimônias satânicas invocando o satanás, que praticam sacrifício com ser humando, homem, mulheres e crianças, que não tem nada a ver com as religiões de matriz africanas. Sou um colaborador dessas entidades, já fui atendido por elas em consultas espirituais.
O termo “macumba do satanás” usado na minha fala em momento alguma foi dirigida a ofender as religiões de matriz africanas.
Respeito o Estado laico, a Constituição Federal e a multiculturalidade. Em momento algum ofendi ou tive a intenção de ofender qualquer religião que preguem a cura espiritual e material, na palavra de Deus.
Cada um é dono da sua consciência, não me sujeitarei a ilações cujo objetivo é fazer intimidação a minhas posições políticas e pessoais, direito garantido na carta magna do país, que o povo me outorgou como parlamentar, que em nome de Jesus Cristo vou continuar defendendo.
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