Taxa Selic: como ficam os juros de empréstimos e financiamentos após a decisão do Copom


Comitê de Política Monetária do Banco Central decidiu manter as taxas básicas de juros inalteradas em 10,50% ao ano, mas endureceu o discurso por conta dos riscos da economia. Calculadora
Mikhail Nilov/Pexels
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC) decidiu, mais uma vez, manter as taxas básicas de juros inalteradas em 10,50% ao ano.
Mas o comunicado divulgado na quarta-feira (31) mostra um discurso mais “duro” (ou hawkish, no jargão do mercado financeiro) por parte da instituição. A valorização expressiva do dólar e a piora das expectativas de inflação para este ano foram citadas como fatores de incerteza nos próximos passos do comitê, que define o patamar da taxa básica de juros do país, a Selic.
Além de a manutenção de juros em patamares elevados ter o potencial de desacelerar a economia e reduzir o apetite dos investidores por ativos de risco, a decisão tem seu peso para a população. Isso porque a taxa Selic também tem influência nos juros de empréstimos e financiamentos, que são motores do consumo.
Entenda abaixo quais os efeitos da decisão para os juros ao consumidor, e quais as expectativas à frente para o mercado de crédito.
Vai ficar mais caro tomar empréstimo?
São vários os fatores que determinam se uma instituição financeira vai ou não reduzir os juros ao consumidor. E o comunicado do Copom nesta quarta-feira criou ainda mais desconforto nos agentes de mercado de que os juros devem cair nos próximos meses.
As políticas de crédito de bancos e financeiras costumam levar em conta o patamar da Selic e os custos operacionais da instituição, bem como os tributos pagos e o índice de inadimplência de seus clientes. Essa equação define o “spread bancário”, a diferença entre a taxa de captação e a taxa de empréstimo.
Mas para além de a Selic não ser o único fator que pode mexer com as taxas dos bancos, vale dizer que o repasse de uma eventual mudança no patamar do juro básico do país tem um período de defasagem para chegar ao consumidor.
Assim, na teoria, qualquer redução por parte do BC só começa a ser sentida de três a seis meses mais tarde — às vezes, mais.
Mas dado o atual cenário, no entanto, essa redução que ainda poderia ser sentida pela população pode não acontecer. Segundo especialistas consultados pelo g1, a decisão de repassar ou não a redução que a Selic teve desde agosto do ano passado para a carteira de crédito é da instituição financeira — e existe uma série de fatores macroeconômicos que pode influenciar essa decisão.
Existe a leitura, por exemplo, de que a piora das expectativas de inflação no país pode acabar afetando o orçamento familiar e trazer, consequentemente, maiores índices de inadimplência no país.
“Como alguns fatores macroeconômicos não estão ajudando, com uma certa fragilidade na definição efetiva da política fiscal do governo, o mercado de crédito já pode começar a ter uma retração”, avalia o economista e professor da Saint Paul Escola de Negócios Maurício Godoi.
Além disso, outro fator que deve influenciar em taxas ainda elevadas para o consumidor é a perspectiva de que o BC não deve mais cortar juros neste ano — e há até quem não descarte a possibilidade de um aumento das taxas à frente.
“A economia é feita de trajetórias e expectativas. E a expectativa agora é que o BC não vai mais reduzir os juros neste ano. Com isso, a leitura da maioria das instituições financeiras é: ‘vou reduzir juro para o consumidor para que?’”, disse a economista e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) Carla Beni.
“Então, a partir do que se desenha hoje, a expectativa é que o consumidor continue pagando juro alto nos empréstimos”, completou a especialista.
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Como isso deve se refletir no mercado de crédito?
Além da perspectiva de juros elevados para a população no curto e médio prazo, os especialistas também ponderam que um eventual aumento da inadimplência ainda pode trazer uma maior restrição ao crédito por parte dos bancos.
“Depende muito da estratégia de cada instituição financeira. Mas o que temos visto de comportamento da inadimplência é que o índice vinha caindo e agora se estabilizou”, disse o vice-presidente de estratégia da Equifax Boa Vista, Caio Macedo.
Segundo o executivo, esse cenário pode ser lido por alguns agentes de mercado como sendo o fim dos efeitos das últimas reduções de juros pelo Copom e das renegociações de dívida trazidas pelo Desenrola Brasil.
“Se a perspectiva [da Selic] se mantiver onde está, o juro para o consumidor deve ficar parecido com o que temos hoje. Isso acontecendo, e se não tivermos nada de novo no país, a tendência é que a inadimplência volte a subir eventualmente”, acrescentou Macedo.
Esse cenário, somado à piora das projeções de inflação para este ano, tende a pressionar o orçamento familiar e diminuir a renda disponível para quitar compromissos, o que também pode influenciar em um menor apetite por risco do lado dos bancos.
O último boletim Focus — relatório do BC que reúne as estimativas do mercado financeiro sobre juros, inflação e câmbio — indicou uma nova elevação nas estimativas de inflação deste ano, que passou de 4% há um mês para 4,10% nesta semana.
Esse quadro, ainda de acordo com os especialistas, também pode se refletir no perfil das concessões do mercado, com instituições oferecendo prazos menores, além de juros mais altos.
“Mesmo com os programas de renegociação de dívidas do governo, a população brasileira ainda está altamente endividada e com dificuldade para tomar crédito. Os bancos já estão com apetite diminuído e não conseguem fazer operações tão estruturadas de médio e longo prazo com juros atrativos porque falta previsibilidade”, disse Godoi, da Saint Paul.
“Assim, a expectativa é de um crédito mais restrito, mais caro, mais curto e mais emergencial ao longo dos próximos meses” completou o economista.
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